Vozes da Casa: Catarina Costa

Com dois anos de casa, a Catarina Costa é livreira, multitasker e dona de um entusiasmo genuíno que contagia quem a rodeia. Fala de livros como quem conta segredos, compara Frankenstein a relações humanas, e declara o seu amor eterno a Crepúsculo… e ao Post Malone. Uma entrevista onde o humor, a emoção e a literatura se misturam como num daqueles romances que ela gosta: com boas reviravoltas, intensidade e um final feliz.
LL: Há alguma memória da tua infância que aches que já te apontava para o mundo dos livros?
CC: Eu sempre gostei muito de ler, desde pequenininha. A minha mãe dava-me uma mesada e eu às vezes nem almoçava na escola para comprar livros. Começou com o Crepúsculo, que é a melhor saga de sempre, esqueçam a Sarah J. Maas! Depois fui lendo, por exemplo Margarida Rebelo Pinto, que hoje não é tão falada, mas na altura era um ícone. Os livros dela eram capa dura, com tecido que tu fechavas com um lacinho, era muito aesthetic.
LL: Como é que a Livraria Lello entrou na tua história?
CC: Conheço a Livraria Lello há muitos anos. Quando era pequenina vinha aqui muitas vezes. Eu trabalhava numa área nada a ver com livros - apesar de também gostar muito - e estava à procura de trabalho para mudar porque fazia muitas noites.
Quando fui para a faculdade tirei turismo e não gostei. Depois entrei na FLUP, em Línguas, Literaturas e Culturas e, na altura, estava a acabar o curso, mas gostava tanto dos livros e de aprender sobre livros que candidatei-me à Livraria Lello. Sempre gostei de ler, juntei o útil ao agradável e fiquei aqui.
LL: Qual foi, até agora, o momento mais especial que viveste na LL?
CC: Eu tenho muitos. Na livraria nós temos uma ligação muito grande entre todos, também pelas experiências que vamos passando e porque eu passo mais tempo com os meus colegas do que com a minha própria família. Mas o momento que mais me marcou foi num dos meus primeiros dias: uma senhora entrou a chorar. A chorar, literalmente. Para nós é banal, não é? Nós temos mar, por exemplo, mas há gente que nunca viu o mar.
A Livraria é assim. Há gente que vem de propósito ao Porto visitar-nos e quando entram começam a chorar - principalmente pessoas da Ásia, porque eles não têm a mesma estética que nós, ou dos Estados Unidos. Se vocês forem lá um bocadinho, de manhã, às 09h00, só ouvem assim "Uau, uau". Houve também um casal, apaixonado pela Livraria, que veio do Brasil de propósito e ele aproveitou a visita para lhe pedir casamento. Eu comecei a chorar, emocionada. Acho que foi um momento mesmo muito bonito. Se queria ser pedida em casamento aqui? Não. Mas achei muito giro.
LL: No teu dia a dia como livreira, o que nunca pode faltar?
CC: Humor. Porque eu acho que o humor e os livros andam sempre juntos. O bom humor e a boa disposição é que fazem com que depois o dia corra da melhor forma.
LL: Romances, dramas, escândalos literários: o que é que mais te atrai numa boa história?
CC: Os romances. Eu ainda gosto muito de ler Young Adult, ok? Não me julguem. Twisted Love, ACOTAR, Maxton Hall. Eu gosto muito daquelas histórias que eles não gostam um do outro e depois apaixonam-se. Mas também gosto muito de clássicos. Gosto muito de Charlotte Brontë, por exemplo.
Mas o romance, sem dúvida, é o que me faz sonhar. Eu não gosto de dramas porque para chorar já basta a vida, não é? Também não sou muito fã de terror. Temos colegas que adoram Stephen King e eu gosto também, mas sou muito eclética no que toca à literatura. Agora estou a ler Off-Campus - leiam, é incrível.
LL: Se pudesses jantar com qualquer pessoa (viva ou não), quem seria?
CC: A pessoa não tem nada a ver com livros. É o Post Malone. Ele é incrível, não só pelas suas letras. Eu já o vi imensas vezes ao vivo e sou obcecada por ele, assim num nível um bocado mau. Eu acho que a música e a literatura andam de mãos dadas. Nós temos músicas que nos marcam a vida, como a poesia, como tudo. E a maneira como ele escreve as músicas, o quão profundo é, isso encanta-me.
LL: Qual foi o livro que mais te marcou?
CC: Frankenstein. O primeiro Frankenstein foi publicado anonimamente, com um prefácio escrito por Percy Shelley, o marido de Mary Shelly. Isto levou a que muitas pessoas acreditassem que o autor seria Percy Shelly e só anos mais tarde, em edições posteriores, é que o nome de Mary Shelley passou a estar na capa. Só esta história já atrai e leva-nos para o tema do quanto as mulheres são oprimidas pela sociedade desde sempre. Hoje em dia acho que continuamos a ser, em certos aspetos.
Este livro marcou-me porque temos uma personagem que constrói um homem e depois abandona-o. E eu acho que isso é a vida. Às vezes temos pessoas na nossa vida que nos marcam e, da noite para o dia, abandonam-nos. Às vezes é a vida que nos afasta, ou mesmo nós que o fazemos sem querer. Nós marcamos as pessoas. E às vezes não temos noção do quanto. E eu acho que esta obra mostra um bocadinho essa parte filosófica: as marcas que deixamos nas pessoas.
A literatura cada um interpreta como quer. A minha interpretação do Frankenstein é esta. Por isso é que gosto mesmo muito. Amo Crepúsculo também, mas isso já tem a ver com a fase em que eu li Crepúsculo: aquela fase feliz em que éramos novos, o Edward, o Jacob — aquilo era uma loucura. Mas o meu preferido é sem dúvida o Frankenstein. É muito giro mesmo. E lê-se muito rápido porque é muito fácil.
LL: Se a tua vida fosse um livro, qual seria o título?
CC: O Caos. A minha vida é um caos constante. Porque eu sou uma pessoa - não sei se dá para perceber - que está sempre a pensar em muita coisa. Sou muito acelerada e muito animada ao mesmo tempo. Por isso acho que se a minha vida tivesse um livro era algo como O Caos, de certeza.